domingo, 25 de setembro de 2011

Glosas de Paulo Barja



A SECA D´ALMA É TÃO DURA
QUANTO A SECA DO SERTÃO
Paulo Barja


No galope cavalgamos
criando nossa poesia
porém, nesse dia-a-dia
é nossa dor que cantamos;
muitas vezes trabalhamos
sem ganhar nenhum tostão,
enquanto muito ladrão
aumenta a própria fartura
- A seca d´alma é tão dura
Quanto a seca do sertão.


O transporte anda pra trás,
teatro é abandonado
e o Banhado é vitimado
por crimes ambientais.
Já ninguém aguenta mais:
vão aprovar a extração
de areia em votação
no meio da noite escura?
- A seca d´alma é tão dura
Quanto a seca do sertão.


Não dá pra aceitar de novo
essa velha ladainha:
distribuem a farinha
mas privatizam o ovo!
Há quem se lembre do povo
só na hora da eleição,
mas nossa reclamação
tanto bate até que fura:
- A seca d´alma é tão dura
Quanto a seca do sertão.
Grande abraço,


Visite, de autoria de Paulo Barja:
www.cordeisjoseenses.blogspot.com
www.cartoesjoseenses.blogspot.com


Foto da postagem obtida em: Sobral Portal de Notícias

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Poesia de Dalinha Catunda




CRUZ NA BEIRA DA ESTRADA
Dalinha Catunda

Cada vez que eu atravesso,                                                  
Estradas do meu sertão.
No transcorrer da viagem
Dispara meu coração
Cada lado da estrada
Tem tanta cruz enfeitada                               
Que causa até comoção.
*
Por detrás de cada cruz
Uma história singular
Um filho que sai de casa
Para nunca mais voltar
Com o coração ferido
Por ter o filho perdido
Tem mãe na cruz a chorar
*
A causa maior se sabe,
É o consumo de bebida.
Jovens inconseqüentes,
Em disparada corrida.
E cada cruz na estrada,
É uma vida roubada
Antecipada e perdida.
*
A cruz na beira da estrada,
No Nordeste é tradição
Tanto se vê no asfalto
Como na estrada de chão
Ela marca o desatino
Marca o trágico destino
Vira lenda no sertão.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Conto-Cordel de Marcos Mairton




Desenho a carvão: Gilvan Lopes

O VIAJANTE E O SÁBIO
Marcos Mairton


Diz a lenda que um homem viajava
À procura de mais sabedoria,
Quando teve a notícia, certo dia,
De um sábio que as montanhas habitava.
Que a tudo que se lhe perguntava,
Respondia, sem sequer titubear,
Com lições que ele sempre ia buscar
Nos provérbios e adágios populares,
Destacando os princípios basilares
Da melhor sabedoria popular. 


Logo que do guru ouviu falar,
Lá se foi, bem depressa, o viajante.
Alguns dias depois, o caminhante
Encontrou o refúgio do avatar.
Mal chegou, pôs-se logo a lhe falar:
– Meu bom homem, disseram-me, outro dia,
Que é imensa a tua sabedoria,
E que vem de provérbios e ditados. 
E, os problemas que a ti são formulados,
Tu respondes com o que já se sabia.


– A verdade e o azeite na água fria
Vêm à tona, cada um na sua hora..
Respondeu logo o mestre, sem demora,
À pergunta que o homem lhe fazia.
E, pegando uma cadeira vazia, 
Ofertou para aquele visitante,
Disse: – Sente-se um pouco, viajante,
Quem tem pressa ou come cru ou quente.
O que eu sei não se aprende de repente,
Também não se fez Roma num instante.


Aceitando o convite, o caminhante
Descansou na cadeira oferecida.
Disse: – Mestre, uma coisa nessa vida,
Que eu acho curiosa e intrigante,
É ver gente que pensa que é importante
Esquecer como a vida é passageira.
Que a alegria de uma noite inteira
Talvez nem veja o sol se pôr de novo.
O que hoje é fortuna para o povo
Amanhã ele joga na lixeira.


– Comentaste uma coisa verdadeira – 
Disse o sábio com ele concordando.
E depois também foi se acomodando
E sentando-se ali noutra cadeira.
– Vaidade não é boa conselheira,
Saiba que tudo muda nesta vida.
Não existe colheita garantida.
De certeza na vida só a morte.
Leva o fraco e também arrasta o forte.
Essa história já é bem conhecida.


– Pois me ajude a encontrar uma saída,
Grande sábio que vive tão distante,
Para outra questão interessante
Que ainda não vi bem respondida:
Dizem que, muitas vezes repetida,
A mentira se iguala à verdade.
Haverá essa possibilidade?
Ou é coisa de gente mentirosa?
Que, contando uma história escabrosa,
Justifica assim sua falsidade?


– Mesmo sendo grande a velocidade
Da mentira, quando ela se espalha,
Sua vida é como o fogo de palha.
É raiz que não tem profundidade.
Eu lhe disse, há bem pouco, que a verdade,
Como azeite, uma hora à tona vem.
Diz o povo, e eu vou dizer também:
Passa o tempo e tudo se descobre,
E quem muito enganou o povo pobre
Hoje, já não engana mais ninguém.


(…)


Digo, ainda, com toda segurança:
Não guarde a luz acesa num armário;
Não se ensina “Pai Nosso” a vigário;
Prudência é irmã da desconfiança;
Desconfie do peso da balança.
Veja se o rezador merece fé;
Muita coisa parece, mas não é;
Muita coisa que é não se parece;
Sob as vistas do dono a planta cresce;
Um sapato não dá em qualquer pé.


(…)


– Grande Mestre, na vida, cruzei mares, 
Conheci muitos povos e nações.
Visitei monumentos e vulcões,
E andei por estradas seculares,
Conhecendo pessoas aos milhares 
Que acreditam que têm sabedoria. 
Mas, hoje eu acredito em quem dizia 
Que ninguém o supera em sapiência. 
Não pensei existir tanta ciência 
nos ditados que o povo pronuncia.


(Trecho do livro “O viajante e o sábio”, editado pela Ensinamento Editora, 2010)

sábado, 17 de setembro de 2011

"O Quilombo do Encantado" no PNBE 2012



"O QUILOMBO DO ENCANTADO" 
PELAS BIBLIOTECAS DO BRASIL

Caros amigos,

É com muita satisfação que compartilho com todos a informação de que meu livro "O Quilombo do Encantado" foi selecionado para o Programa Nacional Biblioteca da Escola - PNBE 2012.

Agora, espero vê-lo nas bibliotecas de muitas escolas do Brasil.

Segue a Portaria

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA

PORTARIA Nº 10, DE 13 DE SETEMBRO DE 2011

A SECRETÁRIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA, no uso de suas atribuições, resolve:

Art. 1º Divulgar o resultado da avaliação pedagógica das obras inscritas para o Programa Nacional Biblioteca da Escola/PNBE, conforme EDITAL DE CONVOCAÇÃO PARA INSCRIÇÃO DE OBRAS DE LITERATURA NO PROCESSO DE AVALIAÇÃO E SELEÇÃO PARA O PROGRAMA NACIONAL BIBLIOTECA DA ESCOLA - PNBE 2012.

Art. 2º As obras selecionadas,contidas na relação anexa a esta Portaria, serão distribuídas às escolas públicas federais e das redes de ensino municipais, estaduais e do Distrito Federal que ofereçam os anos iniciais do ensino fundamental, educação de jovens e adultos - ensino fundamental e médio - e educação infantil - creches e pré-escolas.

Art. 3º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

MARIA DO PILAR LACERDA ALMEIDA E SILVA

CATEGORIA 4 ACERVO 2
CONHECIMENTO EDITORA, O QUILOMBO DO ENCANTADO

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Um texto de Natália Guberev



Basílio Guberev

ÚLTIMAS PALAVRAS AO MEU PAI
Natália Guberev


No dia 08 deste mês de setembro, meu pai deve ter dito para si mesmo: “Hoje, eu já encerrei meu expediente!” Era o que ele costumava dizer ao final de todo dia. Mas desta vez, não só o expediente estava encerrado como a missão fora inteiramente cumprida!!
            
Papai, queria te dizer estas últimas palavras, compartilhando com os que aqui estão:

Antes do meu nascimento, o senhor pensava e torcia para que eu fosse um menino. É, pois já existia a Roberta, com dois anos de idade e o senhor esperava ansiosamente o “garoto do pai”. Até o nome já havia sido escolhido: Erick! Então, eu nasci... uma menina!! Entretanto, só tenho notícias e lembranças do orgulho que sempre teve de suas filhas e da felicidade da família que constituiu, juntamente com a mamãe. Ouvi por diversas vezes que o senhor seria capaz de dar sua vida por qualquer uma de nós!!

O tempo passou, tenho lembranças diversas de toda uma vida em família... Ainda não sei como será daqui pra frente, com essa nova realidade: você partiu para sempre!

Não fui seu filho, mas lhe dei seu primeiro neto, o Portinho, a quem o senhor carinhosamente o apelidou, desde muito pequenino, de Antonov; em virtude de nossa descendência russa, além da semelhança com o senhor e seus familiares.

Deus é tão generoso, que o Antonov, há muito tempo o havia “batizado” espontaneamente de “PAI” - jamais rejeitando sua verdadeira paternidade, mas em sinal de afinidade e amor ao senhor, que por sua vez, na maior felicidade, referia-se a ele de “MEU FILHÃO”!!

Sou muito feliz de ter lhe dado a Natalie – “a princesinha do vovô” e o Antonov – “seu filhão”; que tanto aprenderam com o senhor - valores íntegros e morais, dentre tantas outras coisas!

Acompanhei, muito de perto, desde 2009 sua saúde dando sinais do que eu sempre temi: perder meus pais! Um câncer na faringe se apresentou, mas o senhor foi imbatível como um autêntico vencedor, e de fato, venceu!! Foi uma das maiores alegrias da minha vida, saber que todo aquele sofrimento não havia sido em vão; aquele tratamento cruel, doloroso e prolongado surtiu o efeito desejado! O que para mim, parecia impossível, aconteceu: o tumor desaparecera!!!! Que felicidade!!!

Mas poucos meses depois, precisamente quatro, o senhor adoeceu. Um AVC localizado no tronco do seu cérebro calou para sempre a sua voz e lhe deixou cheio de seqüelas, que lhe impossibilitavam completamente de qualquer tipo de movimento e interação com o meio.

A cada vez que eu ia ao hospital papai, eu te via com menos vida, menos, menos e menos... “A pilha estava cada vez mais fraquinha...”

Não existia mais esperança de melhora, ao contrário, eu sabia que não podia esperar muito daquele quadro.

Sabe pai, eu fiquei doente junto com o senhor e cada vez que te via, eu adoecia mais...Tenho a mais absoluta certeza que o senhor passou por um período de purificação, antes de partir, ainda aqui na Terra, entre nós. Pois como o senhor costumava dizer: “Nossa Senhora do Perpétuo Socorro não faz nada pela metade”. E quando eu lhe via sofrendo mais e mais naquele leito de hospital, sempre lembrava destas suas palavras e às vezes me perguntava: Por que, meu Deus? Por que, minha Nossa Senhora? Por que meu pai não está aqui, mas também ainda não se foi? Por que tanto sofrimento? Por que tanta dor? Questionei-me, por muitas vezes. Mas com o tempo, percebi e acreditei que se tratava de sua purificação, enquanto ser humano! Então, entendi que o ciclo estava completo e não mais pela metade. O senhor tinha toda razão, papai, Nossa Senhora do Perpétuo Socorro não faz nada pela metade. Agora eu sei.

Eu não tenho dúvida que o senhor está num lugar lindo e cheio de luz, e nada mais em você está doendo, papai. Sei que agora o senhor fala, anda, sorri e está feliz!!

Tenho segurança de que ao partir, há sete dias atrás, um belo caminho já o esperava e que o senhor está muito melhor agora do que quando estava aqui. E em paz!

Sua alma é pura e iluminada, generosa, boa, justa, honesta e digna! Tenho muito orgulho de ter sido sua filha e sou muito grata a Deus por ter tido a oportunidade de tê-lo como meu pai.

Obrigada, Deus! Obrigada, papai! 

Jamais, em toda a minha vida, conheci alguém de um coração tão grande, que só cabia bondade!!

Obrigada por tudo! Até um dia... Pode ser que daqui a algum tempo, a dor da partida se transforme em uma bela saudade!

Ah, pai! Não se preocupa, pois do jeito que eu adoeci contigo, vou ficar boa, sentindo você renascer na luz.

                                                                             Tua filha que te ama...
                                                                                Natália Guberev

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Cordel de Geraldo Amancio



A HISTÓRIA DE ANTONIO CONSELHEIRO


No dia em que estive na TV Diário, gravando minha participação  no programa "Ao Som da Viola", de Geraldo Amancio, não imaginei que ganharia presente tão valioso como o livro "A História de Antonio Conselheiro", de autoria do próprio Geraldo.


São 128 páginas nas quais se distribuem dezenas de estrofes em setilhas, formadas de versos ricos em rimas e perfeitos em métrica. O conteúdo, então, é um verdadeiro monumento, contando detalhadamente a história desse herói do sertão nordestino, tal pouco conhecido de todos nós.


A obra de Geraldo Amancio é realmente m show de métrica, rima e oração. Pra completar, juntam-se aos versos as ilustrações do Kazane (todas coloridas) e o belo trabalho gráfico feito pelo pessoal da editora IMEPH.


Antes de apresentar algumas estrofes do cordel - que é realmente um livro - transcrevo palavras do Professor Batista de Lima sore a obra:


Muito já se escreveu sobre Canudos. Afinal, ali se concretizou a maior tragédia brasileira. Calcula-se que em torno de 25 mil pessoas tiveram suas vidas ceifadas naqueles sertões da Bahia. O arraial destruído chegou a ter uma população de 30 mil pessoas o que o levou ao patamar de segundo maior aglomerado humano do estado, perdendo apenas para a capital, Salvador. Pois a destruição foi total, além da morte de 20 mil sertanejos e 5 mil soldados.


O mais famoso relato sobre o episódio é creditado ao livro "Os Sertões", de Euclides da Cunha, mesmo sabendo-se que sua visão dessa saga é de fora para dentro, já que o mesmo era repórter de "O Estado de São Paulo" e fez a cobertura da guerra do lado militar. Falta, no entanto, uma obra que conte a história vista do lado dos sertanejos, de dentro para fora. Mesmo não havendo algo desse nível, há relatos dos acontecimentos que são acreditados pelos leitores. É o caso, por exemplo, do cordel "A história de Antônio Conselheiro", de Geraldo Amâncio.


Geraldo Amâncio Pereira nasceu no sítio Malhada de Areia, no município de Cedro-Ceará, em abril de 1946. Há 47 anos canta ao som da viola. Já gravou 15 CD´s e há 17 anos apresenta um programa de cantoria, na televisão. Também pesquisa sobre cantoria, já tendo publicado duas antologias em parceria com o poeta e jornalista Wanderlei Pereira. Para transformar esse seu novo cordel em um produto de boa aceitação, ele publicou em livro de bela feitura, ilustrado pelo artista plástico Kazane. Assim é que se tem uma obra de arte sobre o sangrento episódio.


A sua pesquisa sobre a saga de Canudos vem apresentada em 283 septilhas, todas em redondilha maior, com rimas nos versos 2, 4 e 7 além de também rimarem o 5 e o 6. Ao todo são 1981 versos metrificados o que perfaz um contingente de 13.867 sílabas poéticas. Isso leva à conclusão de que foi um trabalho de fôlego, tanto na sua elaboração poética como na pesquisa que foi encetada, tendo em vista que os fatos apresentados, bem como o elenco de personagens são absolutamente fidedignos.


A Editora Imeph produziu esse material em 128 páginas, em 2010, trazendo como prefaciador o médico e poeta Luiz Dutra. Os comentários auriculares são do escritor Oswald Barroso. Enquanto Luiz Dutra se ocupa da apologia ao Conselheiro, Oswald faz a ponte entre o messias de canudos e o Geraldo romeiro do Padre Cícero Amâncio. São dois textos à altura da elaboração poética que analisam. É tanto que a certa altura do Prefácio o leitor é alertado para o fato de que o Presidente da República que era Prudente de Morais, nada tinha de prudente. Prova disso é que a destruição de Canudos foi um erro pelo qual ainda pagamos. (O restante do artigo de Batista de Lima pode ser visto em  http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1006238).



Seguem trechos de 


A HISTÓRIA DE ANTONIO CONSELHEIRO
(Geraldo Amancio)


Conselheiro foi um homem
De espírito combativo.
Obstinado e valente,
Decidido e combativo.
Com tanta sabedoria
Conselheiro merecia
Por mil anos ficar vivo.


Do homem cresce o valor
Quando a história compara.
O Brasil tem a mania
De enaltecer Che Guevara
Talvez por ser estrangeiro.
Nosso Antonio Conselheiro
Foi uma jóia mais rara.


(...)


Montou primeiro um comércio
Para comprar e vender.
No magistério ensinava
Ler, contar e escrever.
E no foro trabalhava,
De toda forma buscava
Meios pra sobreviver.


Em qualquer trabalho tinha
Bravura e muita coragem.
Porém, Euclides da Cunha
Denegrindo a sua imagem
De uma maneira mesquinha
Diz n’Os Sertões que ele tinha
Tendência pra vadiagem.


(...)


Com o padre Ibiapina
Muitas lições aprendeu.
Esse sim, amou os pobres,
Do que tinha ofereceu.
Angariou donativos...
“É melhor dar pão aos vivos
Do que chorar quem morreu”.


Antonio tornou-se arauto
Dos sem pátria, dos sem nome.
Sabia ouvir o sussurro
Da multidão que não come.
Uniu sua mágoa a eles,
Porque também era um deles
Conhecia a dor da fome.


(...)


Conselheiro interpretava
A Bíblia à sua maneira.
Não obedecia a bispo,
Nem a padre, nem à freira.
Se ainda existisse a mão
Da tal Santa Inquisição
Seu destino era a fogueira.


Com isso, logo alguns padres
Mostraram-se intolerantes
Dizendo que as leis da Terra
Tinham de ser como antes:
Que o cobre se desse ao nobre,
Tinha que haver rico e pobre,
Os mandados e os mandantes.


(...)


Naqueles sertões desertos,
De esquisitos carrascais,
Multidões embevecidas
Ouviram sermões de paz
Do maior dos conselheiros.
Isso para os fazendeiros
Era incômodo demais.


(...)


Dizem que de Thomas Morus,
Ele leu a “Utopia”.
Uma classe igualitária,
Era o que ele queria.
Sem ambição, sem engodos,
Sendo tudo para todos,
Vivendo em santa harmonia.


Aí rumou para o Norte,
Em penosa caminhada.
Chegando assim em Canudos,
Uma terra abandonada,
Buscou água, encontrou fonte,
E a cidade Belo Monte
Ali seria fundada.


Nesse chão morou um povo
De estranha obsessão.
Fumava cachimbos longos
Quase um metro de extensão.
Eram canudos de pito,
Do nome meio esquisito
Batizaram a região.


(...)


Todos que eram errantes,
Perseguidos, humilhados, 
Foragidos da justiça,
Eternos injustiçados,
Teriam sim, acolhida
Nessa terra prometida,
O céu dos desanparados.




sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Cordel no Diário do Nordeste



CONTOS PARA O CORDEL
Coleção adapta contos de fadas para a literatura de cordel, 
através do trabalho da dupla Arievaldo Viana e Jô Oliveira

Embalando a infância de milhares de crianças no mundo inteiro, os contos de fadas europeus adaptados pelos irmãos Jacob e Wilhelm Grimm, no início do século XIX, ganham versão para a literatura de cordel, a partir da harmonia métrica do cearense Arievaldo Viana e das belas ilustrações do pernambucano Jô Oliveira.

A dupla vem trabalhando na coleção "Era uma vez... Em Cordel", publicada pela editora Globo. Ao todo, 12 histórias clássicas do cânone da literatura infantil serão convertidas em versos. Dois deles, "A peleja de Chapeuzinho Vermelho com o Lobo Mau" e "O coelho e o jabuti", já estão prontos. O lançamento acontece amanhã, na XV Bienal do Livro do Rio de Janeiro.

O cordelista Arievaldo Viana, com presença confirmada no evento, conta que o convite para participar do projeto veio do amigo e parceiro de trabalho Jô Oliveira. "Ele é um grande artista! Um ótimo ilustrador! Jô foi convidado a desenvolver um projeto para a editora. Então, teve a ideia de adaptar contos de fadas dos irmãos Grimm para a literatura de cordel, chamando-me para transformar a história em rima. Os livros estão lindos, uma edição bem caprichada, com ilustrações coloridas e traços parecidos com os da xilogravura. Mais a frente quando a coleção estiver toda completa, vamos trabalhar com o ´Livro das Mil e Uma Noites´, contos populares originários do Médio Oriente".

Livros

Publicado pela primeira vez em 1812, a história da Chapeuzinho Vermelho é uma das mais queridas pelo público infantil. Pelas mãos de Arievaldo Viana, ela se transformou em "A peleja de Chapeuzinho Vermelho com o Lobo Mau". A ideia do conto permanece, mas agora o texto é escrito em estrofes compostas de sete versos. Do mesmo modo, a conhecida fábula "O coelho e o jabuti" ganha uma versão divertida, entoada pela simplicidade e a cadência das rimas de Arievaldo Viana.

"Alfabetizei-me com os folhetos em cordéis. É muito importante para mim poder, de alguma forma, contribuir com a difusão e novas adaptações desse gênero literário. A coleção ´Era uma vez... Em cordel´ também circulará pelas salas de aula do País, fortalecendo mais uma vez o fato de a literatura de cordel ser um instrumento pedagógico potente, capaz de facilitar o processo de ensino-aprendizado de jovens e crianças", destaca.

Além da coleção, Arievaldo Viana vem se dedicando a outros planos. "Estou envolvido em vários projetos, de quais pretendo relançar o livro ´O baú da gaiatice´, um dos meus primeiros escritos. Essa será a terceira edição. Também venho me dedicando à produção de cordéis sobre contos gauchescos (´Causos de Romualdo´), que serão lançados na Feira do Livro de Porto Alegre, em novembro. O cordel é a minha vida. Todos esses projetos são uma forma de tentar manter viva essa tradição na sociedade contemporânea", conta o poeta.

Fique por dentro 
Versos da tradição

A literatura de cordel é um gênero poético que se origina de formas de poesia da tradição popular europeia, trazidas ao Brasil ainda na época colonial. Aos poucos, foi se tornando cada vez mais popular, principalmente no Nordeste. Costuma ser composta em sextilhas (estrofes de seis versos), e abrange os mais diferentes assuntos. Um dos mais famosos artistas do cordel foi Leandro Gomes de Barros (1865-1918). Em sua obra encontramos versões contos populares, histórias de cangaceiros e fatos do cotidiano.

Poesia 
A peleja de Chapeuzinho Vermelho com Lobo Mau 
Arievaldo Viana e Jô Oliveira 
Globo
2011
36 páginas
R$ 34

Poesia 
O coelho e o jabuti 
Arievaldo Viana e Jô Oliveira
Globo
2011
32 páginas
R$ 32

ANA CECÍLIA SOARES
REPÓRTER

domingo, 4 de setembro de 2011

Décimas de Manoel Cavalcante de Castro


DE REPENTE
Manoel Cavalcante de Castro


É preciso que se ouça a correnteza
Pelos hinos de João Paraibano…
Lourival trocadilho “sobre-humano”
Trocou versos trocados por beleza.
Zé Limeira, surreal, a realeza,
Cantou tudo de forma indiscreta,
Desmontou uma poesia já concreta,
Pra gramática se fez de cego e surdo,
O chamado poeta do absurdo
Foi pra mim um absurdo de poeta.


Preciso é pesquisar Manoel Filó,
Manoel “Filosofia” de Menezes…
E um Pinto de Monteiro que por vezes
Triturou cantador com um bote só.
Pinto foi uma serpente que sem dó
Nos poetas fazia um extermínio;
Até quando cantou foi predomínio;
O maior dos melhores do repente.
Foi além dos limites de uma mente
Sempre envolto em tufões de raciocínio.


A TV é preciso desligar,
Já é hora de aumentarmos outro ibope
Viajando com Geraldo num “Galope”
A mil versos por hora sem parar…
Ivanildo e o infindo linguajar
Lhe confere o perfil de gênio e astro,
Deixa os outros bem longe do seu rastro
Porque tem na sua dose de ataque
A perfeita congruência de Bilac
E a fervência descomunal de Castro.


Que sintam a tempestade de emoção
De Eliseu Ventania cancioneiro,
O inventor do estribilho, o pioneiro,
A debruçar na viola uma canção.
“Os Nonatos” novatos também são
Viajores do amor que nos ufana;
O lirismo, qual canção camoniana,
Nos desvenda os mistérios e os segredos;
As palavras para eles são brinquedos
Desenhando as feições da alma humana.


Preciso é reviver o som do pinho
De Cancão, Canhotinho e de Catôta,
E banhar-se pelo menos numa gota
Dos repentes de José Alves Sobrinho.
Se há uma pedra no meio do caminho,
Nosso Cego Aderaldo pode vê-la,
Um gênio oculto que enxergava pela
Mente rápida, mas de extrema calma;
Quem Deus fez com o brilho só na alma
Levou cedo ao céu pra ser estrela…


Roguem a Rogaciano a vida inteira
Que estes versos não morram no silêncio
Qual Inácio, Romano e Inocêncio
Otacílio, Belarmino e Ferreira.
Que se estude a dinastia dos “Bandeira”
E dos “Batistas” quem foi mais cantador?
Doutor Dimas das rimas um doutor,
Um filósofo anônimo sem espaço.
E Oliveira de Panelas voz de aço,
Um poeta com garganta de tenor?


Mas quem são esses poetas, quem serão??
Por que essa fama que é tão minoritária?
Por que não são de uma escola literária?
Serão vítimas de uma suja inversão?!
Faltam muitos aqui na citação,
Mas vou parar e voltar ao meu mundo,
Pois cada verso daqui que for profundo,
Quase não faço em mais de uma semana
E um repentista no bater de uma pestana
Faz mil vezes melhor em um segundo.